P. Este seu novo livro, em forma de diário, tem 140 capítulos e 670 páginas. Há assim tanto Perverso Organizado, disfarçado de bondade, na nossa Sociedade portuguesa, europeia e mundial, que tenha sido necessário escrever um volume tão teologicamente profundo e ao mesmo tempo tão cheio de ternura e de bom humor, para, duma vez por todas, o pôr a nu e nos mobilizar a todas, todos para Práticas Políticas e Económicas outras?
R. Pode parecer estranho, mas a verdade é que há. E não apenas Perverso organizado. O Perverso, hoje, está aí cientificamente organizado e tem ao seu serviço os melhores cérebros, aos quais paga bem. E, se nós, pessoas e Povos, não temos consciência disso, tanto pior. Como alerto, logo na contracapa, este livro vem pôr a nu as máfias que todas as cúpulas das Igrejas /Religiões são. Juntamente com as outras cúpulas do Poder Político e do Poder económico-financeiro. Os três Poderes juntos são a mais perversa Trindade que se faz passar por Deus /o Absoluto na História e que exige dos seres humanos e dos Povos incondicional adoração /submissão. Ai de quem lhes resista, os desmascare e aponte os seus crimes. Serão erradicados da face da Terra e até da memória dos Povos, como se nunca tivessem existido. Foi o que, paradigmaticamente, fizeram com Jesus, o de Nazaré.
P. Mas não há, entre nós, famosos escritores, um deles até Nobel da Literatura 1998, que fazem esse mesmo trabalho, com recurso a um outro género literário, por sinal bastante menos arriscado que com que escreve o seu livro?
R. Sim, há entre nós famosos escritores de romances, um deles até Nobel da Literatura. Porém, não posso deixar de dizer que este meu livro, único no seu género, é assim como um romance teológico da Sociedade e da Igreja, que nem José Saramago, nem António Lobo Antunes, nem José Rodrigues dos Santos, nem Miguel de Sousa Tavares foram /são capazes de escrever. Pela simples razão de que todos eles têm os pés, a cabeça e as mãos entre os privilegiados do Perverso Organizado, que é o idolátrico Sistema Financeiro Mundial. Todos eles vendem muito no Mercado Global, porque continuam a ser /viver nos antípodas de Jesus, o de Nazaré. Saibam que nem o agnosticismo /ateísmo, de que eles tanto se ufanam, escapa à Idolatria do Grande Dinheiro Acumulado e Concentrado.
P. Já que falou em José Saramago, como é que vê esta sua assanhada e quase compulsiva diatribe com a Bíblia judeo-católica e com a hierarquia da Igreja?
R. Com bastante perplexidade. Desde logo, pelo seu discurso demasiado redutor. Da Bíblia, que é uma biblioteca de 73 livros, Saramago toma abusivamente a parte pelo todo e põe-se a dizer cobras e lagartos contra ela, quando, à beira dela, os livros dele todos juntos são como o dia de ontem que já passou. Dou-lhe um exemplo. Só o capítulo 9, do Evangelho Segundo São João, diz infinitamente mais sobre a cegueira humana que nos faz cínicos, cruéis, hipócritas, não-fiáveis, numa palavra, Caim uns com os outros e uns para os outros, do que todo o seu badalado Ensaio sobre a cegueira. Dou-lhe outro exemplo. Quando ele publicou O Evangelho Segundo Jesus Cristo, eu comentei, na altura, que o Diabo do seu romance conseguia ser muito melhor do que Deus. E decidi meter mãos ao trabalho, até que, alguns anos depois, publiquei, como em alternativa ao seu romance,, O outro Evangelho Segundo Jesus Cristo, no qual Jesus surge em toda a sua grandeza de Ser Humano que enfrenta desarmado o Ídolo do Templo de Jerusalém e do Império Romano e o obriga a mostrar todo o Perverso organizado que intrinsecamente é, pai gerador de Mentira, de Pobreza e de Assassínio em massa. E, agora, este seu livro Caim é um romance confrangedoramente cego. Nele, Saramago atira-se, furioso, ao Deus que anda na sua cabeça de ateu assumido e, entretanto, não diz uma única palavra contra o Ídolo dos Ídolos, que o Dinheiro Acumulado e Concentrado, que todos os dias está aí cientificamente organizado, a matar, roubar e destruir as populações e os Povos. Acho, por isso, que até Saramago, ateu assumido, precisa de mudar de Deus, tal como os bispos e os presbíteros dos privilégios. Porque o Deus que Saramago combate só existe na cabeça dele. De modo que esta sua “pega” com Deus está a revelar um Saramago com tudo de Sancho Pança e de D. Quixote, que filtra mosquitos e engole camelos. É por estas saudáveis e fecundas águas que meu livro “Apocalipse” navega, da primeira à última página. Como bem disse o escritor angolano Luandino Vieira, na sessão de apresentação, este é um livro para andar sempre connosco, para onde quer que a gente vá. Basta um dos seus muitos versículos, mesmo que lido ao calha, para nos ajudar maieuticamente a mudar o rumo do nosso ser-viver.